Havia pedido à minha avó para me fazer uma trança e usava um vestido de ganga e uns ténis vermelhos, a minha mochila era amarela e destacava-se numa multidão de aborrecidas mochilas Monte Campo. Não fui nada nervosa nem acanhada, destaquei-me pela determinação dos meus passos em direcção à sala de aula. Não aprendi grande coisa nos primeiros tempos, o bê-á-bá eu já o sabia de cor e nem nas matemáticas precisava de prestar atenção. Dediquei-me, por isso, a observar os rapazes, uns não mereciam mais do que cinquenta segundos, não tinham nada de interessante, tiravam macacos do nariz enquanto as suas caras demonstravam que estavam aborrecidos e completamente perdidos nas somas e subtracções. Outros vinham suados do recreio, as bochechas rosadas prendiam-me a atenção, escreviam no caderno com muita força, partiam o bico do lápis com frequência, estavam empenhados e tranquilos naquele início de vida. Comigo eram todos iguais, cumprimentavam-me todas as manhãs no corredor da escola, mas nunca me deram muitas confianças, creio que a minha mochila amarela intimidava-os.
-Bom dia, Helena! – dizia o David ainda a beber o leite com chocolate e sem tirar a boca da palhinha, normalmente chegava cedo e parecia ser viciado em bebidas em pacote. O David era acanhado e pouco divertido, era raro jogar connosco no intervalo e comia demais. Ouvi dizer que se formou em finanças, não lhe daria melhor profissão, deve continuar a beber bebidas de pacote e vai fazer rugas mais cedo que eu.
-Bom dia, David. – Respondia-lhe, com as mãos presas nas alças da minha mochila amarela.
Depois a turma ia juntando-se à porta da sala cinco à espera da professora ou à espera de receber a maravilhosa noticia de que não havia aulas, mas nunca tivemos essa sorte.
A entrada no meu diário relativa ao último dia de aulas do primeiro ano, “17 de Junho de 1994”, descrevia esta história com muito mais amor e muito menos correcção linguística.